Deutschland Dancefloor Klub

(Parte integrante do livro Mantenha a calma, não há rinocerontes neste livro.)      

Não me lembro exatamente como acabei lá, só que estava alcoolizado. Arrastado por alguns amigos, talvez. Se sim, não os vi mais lá dentro. Tinha cabelo longo e liso, o que me colocava sem eu saber numa das castas altas do lugar. Meu cabelo fazia as pessoas me oferecerem bebidas grátis de diferentes cores, virem conversar comigo sem razão aparente e deixava as garotas do lugar molhadas entre as pernas. A primeira garota com quem fiquei foi no segundo andar, lugar escuro e esfumaçado. Fui até ela, pois era uma cópia idêntica de uma garota que me deixava ereto na escola. Uma cópia idêntica uns 20 centímetros a menos - melhor, podia facilmente levantá-la. Nunca fiquei com a original, me deleitei com a cópia 20 centímetros mais baixa. No meio de apertos, ela parou e apontou para amiga, “ah, ela está sozinha, não posso deixá-la assim sem ela ficar com ninguém”, e disso eu entendi o que qualquer pessoa normal entenderia nessa situação, que eu também deveria ficar com ela, então eu fiz isso. Mas queria mesmo é ficar com a cópia da que me deixava ereto na escola, logo voltei para a outra. “isso é assim para você, fica pulando de uma para outra!” “mas você me disse para fazer isso!” “aí... ok, ok!” e ficamos os três o resto da noite. Alguns meses depois descobri pelo Orkut que virara lésbica. Não foi minha culpa!

Essa foi a primeira vez que fui na DDK, uma festa, meio gótica, de eletrônica e metal – acho, nunca prestei muita atenção –, tinha quase todo mês no Cine Iris, um antigo cinema pornô do centro do Rio de Janeiro. Durante o dia, velhos de noventa anos eram masturbados por travestis em suas cadeiras de cinema; durante à noite, havia festa. Não me importava muito com as músicas, não sabia quem era o vocalista de uma banda chamada HIM, com quem constantemente me comparavam, nem me interessava por saber, não pensava muito de gente vestida de preto, “hardcore”, de tatuagens e pircings, mas meu deus, o poder que ter cabelo longo me dava era bem interessante, e eu comprei uma fantasia, uma camisa preta da Hering, só para isso, e ficava uns 30 minutos tirando os pelos dos gatos da minha casa que grudavam nela, sempre que tinha festa. E olha que nem deixei o cabelo crescer de propósito, simplesmente aconteceu, tipo todo dia, acordava e ele estava maior, maior e maior. A minha barba também fez isso durante um tempo, mas decidi raspá-la, pois fazer parte do grupo dos mendigos e comunistas, não me oferecia muito em retorno.

Virei um frequentador.

O maior número de pessoas encontrava na porta, o maior número de líquidos de cores diferentes bebia, o menor número de horas dentro da festa me lembrava. Lembro da fila, lembro de alguém dizendo que tinha rasgado o vestido de uma garota, lembro das cadeiras do cinema, e depois estava já andando na rua, indo embora com um grupo, e com um chapéu coco na minha cabeça. Sem falar que no ônibus, descobri uma gigantesca feria no meu antebraço e marcas de sangue. Outra festa, em situação parecida, fiz grande amizade com uma banda de heavy metal no banheiro. Eles seguravam meu cabelo, enquanto eu vomitava. Fiquei tão sensibilizado pelo companheirismo, que decidi que seriam meus melhores amigos. Adicionei-os no Orkut e nunca mais falei com eles.

Depois de um tempo, pelo menos, nos dias com menos bebidas coloridas, cheguei a perfeição existencial assumindo o papel de Conde Drácula, descendo as escadas espirais de uma andar para o outro, vagarosamente, caçando minhas presas. Não haviam escadas espirais, mas haviam muitas presas, e tenho quase certeza que fazia uma boa interpretação de Bela Lugosi. Meu máximo foram oito garotas em 4 horas, me orgulhava disso. E se umas não me viam ficando com outras durante a festa, ou não se importassem com isso, reencontrava-as durante a semana, para fazer o que o álcool não me deixava fisicamente disposto a fazer após a festa.

Uma vez no terceiro andar, o terraço, vi recostada sobre o telhado central, uma bela garota loira de olhos azuis, vestida toda de preto, com uma expressão muito triste, cabisbaixa. Fui falar com ela, estava bêbada, mal falava direito, mal consegui seu nome, dois amigos apareceram de segurança e me enxotaram. Não tive muita retórica para enxotá-los de volta, também bêbado. Mas estava apaixonado, e sabia que qualquer coisa que ela estivesse passando, eu poderia reconfortá-la, eu poderia fazê-la feliz. Só precisava reencontrá-la numa melhor situação. Reencontrá-la para que ficássemos juntos, felizes juntos, sem precisar acabar em festas como aquelas. Seria feliz fazendo ela feliz. Não a vi mais na festa, entrei em cada um dos 923 perfis da comunidade do Orkut da DDK procurando por ela.  Não a achei. Fiquei semanas até a próxima DDK, sonhando com o dia que estaríamos juntos. Quando não foi, eu fiz o mesmo por mais um mês. Nunca mais a vi.

Não ia só em grupos de amigos, algumas vezes já ia acompanhado para festa, e algumas vezes saia desacompanhado das companhias que levei. Um amigo me contou, que uma ficou meio irritada, porque esqueci do seu nome. E não importasse o quanto o repetia, eu continuava esquecendo. E ela ficou um pouco mais irritada, porque quando ela reclamava disso, e que estávamos juntos há 3 meses e não a pedia em namoro, eu lhe dava um tapa na bunda e falava “comporte-se!”. Foi esse o dia que sai de chapéu coco, não lembro. Foi o mesmo amigo que me disse que tentei subir no telhado e por isso estava sangrando, também não lembro.

Na porta encontrei uma amiga de minha ex-namorada, de dois anos juntos, acabamos só há 2 meses, voltava pela primeira vez a DDK, depois de só ter ido uma única vez com ela, enquanto namorávamos. Ela disse “caramba, não sabia que vocês tinham acabado, pareciam tão bem juntos!” Acredito ter passado duas ou três horas sozinho, sentado numa das cadeiras do cinema, chorando descontroladamente. Algumas pessoas paravam e me olhavam, outras perguntavam se estava bem, outras pareciam que queriam que eu as cantasse. Foi isso no mesmo dia?

O que constitui um estupro? Você estar bêbado e andando pela festa, e uma garota do nada, aparecer e te agarrar pelo braço, te arrastar até o Dark Room, uma arquibancada do segundo andar do cinema, com um chão duro de cimento, abrir as suas calças e começar a te chupar, mesmo você estando bêbado demais para sequer pensar em ter uma ereção? Talvez. Mas dois meses depois, quando você está apaixonado por sua melhor amiga, e ela vira uma fiel confidente, dando conselhos e sugerindo músicas para mandar por MSN, afim de reconquistá-la, desde que você não tratou ela muito bem, e ela acabou de começar um namoro, no exato dia seguinte que acabou com você. Não sei. Parei de ir há alguns anos.

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